A colangite é uma doença sindrômica, caracterizada pela presença de febre, icterícia e dor abdominal (conhecido como tríade de Charcot), presente em 50-75% dos casos. Quando estes sintomas se associam à
confusão mental e hipotensão arterial (pêntade de Reynolds), indicam pior prognóstico e aumento na morbi-mortalidade.
A fisiopatologia da colangite pode ser explicada pela associação de estase biliar, com obstrução do
ducto principal e ascensão à via biliar de bactérias (E. coli, Klebisiella e Enterobacter) provenientes do duodeno. Os cálculos correspondem a 28-70% dos casos, estenoses benignas 5-28% e as malignas 10-57% das causas da colangite.
Na suspeita diagnóstica, deve-se estabelecer um quadro sindrômico e sempre considerar os demais diagnósticos diferenciais como: apendicite aguda, colecistite aguda, diverticulite aguda, pancreatite aguda, entre outros. Para o diagnóstico definitivo segue-se a utilização dos critérios de Tóquio (icterícia, febre, leucocitose, proteína C reativa e enzimas canaliculares aumentadas). Para isso, são solicitados exames
laboratoriais como: fosfatase alcalina, gamaglutamil transpeptidases, bilirrubinas totais e frações, proteína C
reativa, podendo ainda associar exames para verificação de lesão hepática (aumento de transaminases) que podem sugerir a presença de microabscessos hepáticos. Para a confirmação diagnóstica, um exame de imagem complementar como ultrassonografia de abdômen total é solicitado, e pode revelar dilatações de
vias biliares assim como falhas de enchimento em colédoco. Se a ultrassonografia concluir não haver alterações compatíveis, pode-se optar pela tomografia computadorizada (TC) ou colangioressonância
magnética.
Diante da suspeita clínica inicial de colangite, medidas já devem ser tomadas como: seguimento em ambiente hospitalar (internação) com monitorização para sinais de sepse, hidratação intravenosa, reposição de fluidos intravenoso e antibioticoterapia de amplo espectro o mais breve. Dentre os antiobióticos empíricos a serem iniciados são:
cefalosporinas de 3ª geração (ceftriaxone associado a metronidazol, ou
quinolonas (ciprofloxacino) associado a metronidazol, em alguns casos seletos pode-se iniciar com carbapenêmicos. Em até 20% dos casos, não há boa resposta inicial ao tratamento, principalmente em
pacientes com dor abdominal persistente, febre persistente acima de 39º, confusão mental, cálculos impactados na papila, tabagistas ativos e idade superior a 70 anos. Nestes, há necessidade de seguimento do paciente em leito de terapia intensiva e brevidade na terapêutica da drenagem da via biliar.
Quando é estabelecido o diagnóstico, deve-se solicitar a colangiopancreatografia retrógrada endoscópica (CPRE) com objetivo terapêutico de drenagem da via biliar principal. O exame deve ser realizado dentro de até 48 horas em pacientes estáveis e responsivos as medidas iniciais, ou em até 24 horas nos pacientes sem sinais de melhora clínica. A CPRE com remoção do fator obstrutivo e/ou colocação de próteses é o tratamento de escolha. Se a CPRE não for satisfatória, pode-se optar por outros meios de
drenagem da via biliar como: ecoendoscopia, drenagem transparietohepática ou cirúrgica, porém esta, com
maiores índices de morbi-mortalidade.
Cálculos maiores que 20mm exigem medidas a mais como dilatação da papila duodenal e/ou litotripsia associada e que na maior parte dos casos não deve ser feita durante a
urgência – colangite.
Pacientes gestantes devem ser submetidas às mesmas medidas, contudo a escolha do antibiótico
deve-se levar em conta a toxicidade fetal. Além disso, devem ser utilizados protetores radiológicos e minimizar o tempo de exposição radiológica. Em pacientes anticoagulados ou com distúrbios de coagulação
no momento do procedimento, pode-se optar pela passagem de prótese biliar sem necessidade de
enfincterotomia.
As parasitoses biliares podem também serem causas da colangite, especialmente em regiões endêmicas como sudeste asiático e América do Sul. A contaminação ocorre pela migração através da papila
duodenal, íntegra ou não, causando obstrução e estase e outras complicações. O principal helminto desta afecção é o Ascaris lumbricoides (comum na Índia), porém em países andinos como Peru e Bolívia, verifica-
se maior incidência do Fasciola hepatica. O tratamento assim como nas demais colangites, é a remoção do fator obstrutivo com a remoção dos parasitas. Deve ser associado a CPRE o uso de medicamentos específicos, como albendazol ou mebendazol (ascaridíase) e triclabendazol (fasciolíase).
Além da forma aguda, a colangite pode ter uma condição crônica, chamada de Colangite Piogênica
Recorrente (RPC). São caracterizados por episódios recorrentes de infecção bacteriana do trato biliar.
Acredita-se que o evento inicial seja a entrada por meio da flora duodenal na árvore biliar, causando infecção e inflamação e a formação de cálculos primários (por meio da desconjugação do diglicuronídeo de bilirrubina). A persistência na inflamação pode causar estenoses biliares e estase da via biliar, incentivando
ainda mais a formação de cálculos, levando a um ciclo vicioso e persistente. Há ainda relatos de RPC em pacientes com helmintíase (Ascaris lumbricoides e Clonorchis sinensis). O tratamento bem-sucedido da RPC, assim como na colangite aguda, depende da remoção do cálculo e dilatação de estenoses, evitando assim a estase biliar.
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